Escrever para si mesmo pode ser libertador
A página em branco é um espaço que, apesar de aparentemente inofensivo, pode se tornar uma espiral de dúvidas sobre nossa criatividade. Porém, existe uma segredo para superar o entrave: começar a escrever, mesmo que a princípio as palavras sejam desconexas.
A escrita é um processo gradual e não devemos esperar surgir a inspiração para começarmos a criar.
Quando falamos em escrita para otimização nos mecanismos de busca, para quem é redator SEO, ela segue um padrão que deve conter palavras-chaves e regras que precisam ser seguidas, certo?
Muitas vezes recebemos um briefing que contém os temas a serem tratados e já sabemos de antemão qual será a hierarquia dos tópicos.
Porém, neste artigo vou falar sobre outro tipo de escrita e sobre como estimular a escrita criativa que, inclusive, pode ajudar a tornar mais fluido o ato de escrever em outros contextos.
Sumário do post
Nem tudo o que escrevemos precisa ser publicado
Nem sempre o que escrevemos precisa ser compartilhado. Existem momentos em que as palavras que colocamos no papel são apenas para nós mesmos e isso é algo positivo para quem deseja tornar a escrita um hábito.
Tenho uma pasta na qual anoto ideias aleatórias, em geral ao fim do dia, porque sei que, mesmo sem publicá-las, estarei exercitando os neurônios ao escrever livremente.
A partir do que foi escrito, podem surgir insights que se tornarão ideias de conteúdos em algum momento, mesmo que o objetivo inicial não tenha sido esse, pelo simples fato de que ao tirarmos um tempo para reflexão ou para registros, mesmo que descontínuos, e mesmo que pareçam sem importância, isso faz com que a mente saia do modo automático.
É claro que nem tudo o que nos propomos a escrever de forma livre para praticar a escrita será de qualidade ou de relevância para o público. Nossas palavras podem sair confusas, desorganizadas ou simplesmente não serem nada mais do que ideias vagas.
Afinal, nem todo rascunho precisa se transformar em uma obra-prima. Porém, penso que a inspiração é algo que pode ser cultivado e não algo que simplesmente acontece.
Os rascunhos ruins
Stefanie Flaxman escreveu um artigo na Copyblogger – Embrace Bad Writing to Master Great Writing – que traduzido significa Abrace uma escrita ruim para dominar uma escrita excelente. Ela afirma que “muitas vezes não paramos para pensar em todas as versões de um conteúdo que existia antes de ser publicado”.
Quando vemos um conteúdo pronto, podemos ter a impressão de que alguém simplesmente o escreveu em poucos minutos, sem necessidade de amadurecer as ideias.
Para desconstruir este pressuposto, Flaxman lembra que os rascunhos iniciais tendem a ser ruins mesmo, o que me faz lembrar de Anne Lamott, que também diz que todo primeiro rascunho será ruim, mas isso não é algo que deva nos impedir de continuar, apenas faz parte do processo de escrita.
O rascunho serve como uma etapa exploratória, na qual podemos organizar os pensamentos. Logo, é comum que as ideias ainda não estejam completamente formadas e que a estrutura do texto não esteja clara.
Muitas vezes, o primeiro rascunho é afetado pela pressão criativa. Queremos receber a iluminação para escrever perfeitamente um conteúdo sem dificuldades no menor tempo possível. Nem sempre isso acontece.
Dependendo do formato ou tipo de conteúdo, as ideias ainda precisarão ser organizadas, talvez elas precisem “dormir” por um tempo e, ao final, haverá a revisão para esculpir o texto como desejamos.
Por isso, ao exercitar a escrita criativa, não é bom ter expectativas elevadas sobre a qualidade do primeiro rascunho, para não idealizar o resultado final ainda no início. Além disso, as dificuldades que o ato de escrever implica não recaem apenas sobre os meros mortais.
Grandes escritores também enfrentam dilemas
É claro que diferentes conteúdos podem ter diferentes níveis de complexidade, e mesmo escritores de renome já se depararam com dilemas da escrita.
Eles também são pessoas de carne e osso e já duvidaram de si mesmos, em algum momento acreditaram que o texto escrito não era bom o suficiente, já tiveram medo de não conseguirem se sustentar pela escrita ou tiveram que enfrentar o desânimo.
Virginia Woolf, Franz Kafka, Flannery O’Connor, Neil Gaiman, Joyce Carol Oates e Stephen King são alguns exemplos.
Em Sobre a escrita, Stephen King conta o episódio de quando estava ainda no colégio, no qual ele havia escrito uma história de terror de oito páginas (de uma mulher enterrada na parede, cuja inspiração foi o filme Mansão do terror, escrito por Richard Matheson).
O livreto circulou pela escola e lhe rendeu alguns dólares. Nas palavras do autor:
“A mansão do terror acabou se tornando meu primeiro sucesso de vendas. Levei toda a tiragem para o colégio na pasta (…) e, ao meio dia, já tinha vendido duas dúzias”. Ele conta que no fim da tarde já havia vendido três dúzias.
King foi chamado à direção do colégio porque “não podia transformar a escola em mercado” e a professora Hisler, que não gostou do livro, disse:
“O que não entendo, Stevie – disse ela – é por que você decidiu escrever um livro como este. Você tem talento. Por que desperdiçá-lo?”.
Sobre o episódio, King diz o seguinte:
“Estava envergonhado. Muitos anos se passaram – anos demais, eu acho – até que eu perdesse a vergonha do que escrevia. Acho que só depois dos 40 anos me dei conta de que praticamente todos os escritores de ficção e poesia que já publicaram uma linha que seja foram acusados de desperdiçar o talento que Deus lhe deu. Se você escreve (pinta, dança, esculpe ou canta, imagino eu), alguém vai tentar fazer com que você se sinta mal com isso, pode ter certeza”.
Depois do ocorrido no colégio, King teve que devolver o dinheiro para os colegas. Mas ele acabou escrevendo outro livro nas férias e imprimiu quatro dúzias, das quais sobraram quatro ou cinco exemplares.
“Acho que isso significa que, no fim, venci, pelo menos financeiramente. Lá no fundo do coração, no entanto, continuei envergonhado. Eu continuava ouvindo a srta. Hisler perguntando por que eu queria desperdiçar meu talento e perder meu tempo escrevendo lixo”, lembra o autor no livro Sobre a escrita.
Sobre a opinião dos outros
Quando você escreve apenas para si mesmo, sem a intenção de publicar, há uma grande vantagem que é não ter que se importar com a opinião dos outros.
Temos a oportunidade de adentrar nossos pensamentos e emoções sem medo de críticas. Isso nos permite até mesmo sermos mais autênticos, porque escrever pode ser uma maneira de liberar sentimentos aprisionados.
Quando nos preocupamos com o que os outros vão pensar, podem surgir constrangimentos e, para quem não gosta de se expor, pode causar ansiedade.
Talvez por isso muitas pessoas prefiram publicar livros com um pseudônimo. Entendo completamente, porque tenho escrito poesias para exercitar a escrita criativa e, quando penso em publicar, a primeira ideia que me vem à mente é optar por um pseudônimo.
Porém, até que ponto o medo de exposição não é algo que precisa ser enfrentado? Seria sinal de fraqueza não querer expor outros tipos de escrita com medo do que os outros poderiam pensar? Não tenho uma resposta, porque vivo o dilema.
Mas, independentemente da decisão de se expor ou não, quanto mais escrevemos, mais praticamos e aprimoramos nossas habilidades de escrita. E escrever apenas para si mesmo pode ser bastante libertador.
Leia também: Como ter inspiração para escrever com a leitura de livros?